domingo, 5 de julho de 2009

Relatório final da pesquisa Juventude do Ficar

INTRODUÇÃO
Este relatório refere-se ao trabalho de avaliação final da disciplina de Núcleo Temático – Juventude, Cultura e Cidade, oferecida pela Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Seu objetivo, de acordo com a ementa é estudar o destaque da categoria juvenil no cenário sócio-político; juventude(s) e as abordagens pelas diferentes disciplinas – consensos e contra-censos; as várias expressões juvenis no contexto brasileiro; juventude urbana – vivências no contexto cotidiano; culturas juvenis e os temas emergentes.
Para tanto a turma foi dividida em duplas, onde foram propostos diferentes temas a serem trabalhados durante o período. O tema que escolhemos foi a relação da juventude com as novas formas de relacionamentos afetivo-amorosos,como por exemplo o “ficar”. No decorrer de nossa pesquisa damos ênfase a relação de gênero presente nesta modalidade de relacionamento amoroso, bem como, as formas de encarar o ficar na juventude atual.
O “ficar” é caracterizado como um tipo de relacionamento passageiro, volátil, descartável e breve, isso é, que a princípio não implica em compromisso futuro. É muito popularizado entre os jovens que vivem no contexto urbano e apesar de ser encontrada essa designação em outras faixas de idade, emergiu como um tipo de relacionamento próprio dos jovens.
Podemos afirmar que o “ficar” possui estreita relação com a fase atual em que vivemos, onde a fragmentação e o inconstante é visível em várias dimensões da vida social, inclusive nas relações de trabalho. Acreditamos que o ficar é influenciado pela cultura pós-moderna marcada pela imediaticidade e o hedonismo.

OBJETIVO
Estudar as novas formas de relacionamentos afetivo-amorosos vivenciados na juventude, a partir da percepção feminina, e conhecer demais elementos da contemporaneidade que condicionam a escolha por esse tipo de relacionamento.

METODOLOGIA
A elaboração do trabalho se deu em três etapas. A primeira consistiu na abordagem teórica da temática. Para isso verificamos alguns autores que tratam dos conceitos de sexualidade, de juventude, de gênero e das relações amorosas. Na segunda etapa realizamos o trabalho de campo, no qual, entrevistamos e acompanhamos um grupo de meninas que assumem abertamente preferir esse tipo de relacionamento. A terceira etapa se deu na elaboração desse relatório que apresenta algumas considerações que podemos observar durante o tempo de execução do projeto.
Para isso, optamos por trabalhar com dois grupos distintos de jovens universitárias entre 20 e 25 anos, que aderem à prática do ficar. A pesquisa é de natureza qualitativa, com roteiro de entrevistas semi-estruturado. Acompanhamos o grupo de entrevistadas em dois eventos e suscitamos debates grupais sobre temas relevantes para pesquisa.

CONCLUSÃO
Ao longo do processo pudemos observar que a metodologia utilizada foi de grande importância para a nossa análise, visto que através dela podemos observar as contradições e aproximações existentes entre a fala e a prática das entrevistadas.
Podemos afirmar que parte das informações colhidas foram confirmadas durante o trabalho de campo. Grande parte do discurso apresentado pelas entrevistadas pôde ser confirmada em suas práticas cotidianas. As entrevistadas denotam o “ficar” como um tipo de relacionamento fortuito, passageiro e ao saírem com os amigos para a diversão (baladas, festas e barzinhos), apontam que sua prioridade não é o “ficar”. Podemos perceber tal questão na observação de campo durante o baile funk
[1]. No contato com os parceiros houve o momento de trocas de beijos e carícias, porém não vislumbraram futuros contatos, e quiseram dar fim a “ficada o mais rápido possível. Outro ponto observado no campo é o da escolha de parceiros. Em geral, elas afirmam que o critério para eleger os “ficantes” na noitada é a beleza e “estilo”, além disso, muitas falam da necessidade de se ter “bom papo”. Durante o evento do churrasco podemos perceber que esses padrões exigidos pelas meninas se encontram em uma lógica de identificação com o ambiente social em que elas freqüentam, portanto elas tendem a escolher meninos brancos, universitários e com estilo de falar e se vestir próximo ao delas.
Embora as jovens demonstrem serem progressistas e não possuírem preconceito – fato pelo qual nos chamou atenção para nossa aproximação – durante os eventos em que as acompanhamos, essas demonstram possuir um preconceito velado. Isso pôde ser observado na negação de qualquer relacionamento com pessoas com nível educacional abaixo do que elas exigem como tolerável.
Durante nossa pesquisa bibliográfica, tomamos como hipótese que a atual liberdade sexual adquirida pelas mulheres advém, em grande parte, das lutas e reivindicações do movimento feminista, em prol da liberdade destes sujeitos sociais. Em nossos grupos de discussões as entrevistadas concordam sobre a importância deste movimento e que estes trouxeram muitas conquistas para as mulheres, como inserção no mercado de trabalho e universidades. Porém, não conseguem enxergar a influência deste movimento na atual conjuntura em que se insere o sexo casual praticado pelas mulheres. Reafirmam sua postura quanto a este tipo de atitude, como prática individual, e algumas vezes reagem negativamente contra aquelas que praticam. Percebemos que as entrevistadas legitimam a assimetria entre os sexos no momento do “ficar”, uma vez que recriminam aquelas que praticam sexo casual e fazem brincadeiras, implicitamente preconceituosas, com aquelas que saem com mais de um homem por noite, porém quando estas atitudes são praticadas por homens são vistas como naturais.
Concluímos que o ficar não tem sido encarado como prioridade em uma noitada, porém uma saída perfeita deve ter beijo na boca. As entrevistadas priorizam se divertir com as amigas em contraponto a ficar com meninos. Embora não supervalorizem o ato do casamento, as entrevistadas têm as perspectiva de se casarem como forma de experimentar tal experiência, porém não descartam a possibilidade de divórcio, legitimando as múltiplas formas de família, como as monoparentais.
O trabalho foi de grande relevância para nossa formação profissional, visto que podemos ter contato com diversos aspectos que envolvem juventude, cultura e sociabilidade. Porém, cabe destacar que temática envolve muitas dimensões que extrapolam juventude e sexualidade que não puderam ser esgotadas neste trabalho devido a curto período para sua realização.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CALAZANS, G. Os jovens falam sobre sua sexualidade e saúde reprodutiva: elementos para reflexão.In: Retratos da Juventude Brasileira. Análise de uma pesquisa nacional. Abramo HW, & Branco PM,org. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo/Instituto Cidadania, 2005.

HEILBORN, Maria Luiza. “Construção de si, gênero e sexualidade”. In: HEILBORN, Maria Luiza (Org.). Sexualidades: o olhar das ciências sociais. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, [40-58], 1999.


JUSTO, J. S. . O "ficar" na adolescência e paradigmas de relacionamento amoroso na contemporaneidade. In: FIGUEIRÓ, M.N.D.; RIBEIRO, P.R.M.. (Org.). Adolescência em questão: estudos sobre sexualidade. Araraquara: Cultura Acadêmica, 2006, v. , p. 75-102.

LOURO, G.L. Nas redes do conceito de gênero. In: LOPES, M. J. M; MEYER, D.E.; WALDOW, V.R. (Orgs.). Gênero e Saúde. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.

TORRES, M. R. . Sexo, Prazer e Dor: Vivências Sexuais na Fala de Adolescentes Pobres de Salvador. In: Regina Maria Barbosa. (Org.). Interfaces: Gênero, Sexualidade e Saúde Reprodutiva. Campinas: Unicamp, 2002, p. -.


[1] O relatório deste trabalho de campo encontra-se neste blog postado no dia 04/07/09

Nenhum comentário:

Postar um comentário