domingo, 5 de julho de 2009

Relatório final da pesquisa Juventude do Ficar

INTRODUÇÃO
Este relatório refere-se ao trabalho de avaliação final da disciplina de Núcleo Temático – Juventude, Cultura e Cidade, oferecida pela Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Seu objetivo, de acordo com a ementa é estudar o destaque da categoria juvenil no cenário sócio-político; juventude(s) e as abordagens pelas diferentes disciplinas – consensos e contra-censos; as várias expressões juvenis no contexto brasileiro; juventude urbana – vivências no contexto cotidiano; culturas juvenis e os temas emergentes.
Para tanto a turma foi dividida em duplas, onde foram propostos diferentes temas a serem trabalhados durante o período. O tema que escolhemos foi a relação da juventude com as novas formas de relacionamentos afetivo-amorosos,como por exemplo o “ficar”. No decorrer de nossa pesquisa damos ênfase a relação de gênero presente nesta modalidade de relacionamento amoroso, bem como, as formas de encarar o ficar na juventude atual.
O “ficar” é caracterizado como um tipo de relacionamento passageiro, volátil, descartável e breve, isso é, que a princípio não implica em compromisso futuro. É muito popularizado entre os jovens que vivem no contexto urbano e apesar de ser encontrada essa designação em outras faixas de idade, emergiu como um tipo de relacionamento próprio dos jovens.
Podemos afirmar que o “ficar” possui estreita relação com a fase atual em que vivemos, onde a fragmentação e o inconstante é visível em várias dimensões da vida social, inclusive nas relações de trabalho. Acreditamos que o ficar é influenciado pela cultura pós-moderna marcada pela imediaticidade e o hedonismo.

OBJETIVO
Estudar as novas formas de relacionamentos afetivo-amorosos vivenciados na juventude, a partir da percepção feminina, e conhecer demais elementos da contemporaneidade que condicionam a escolha por esse tipo de relacionamento.

METODOLOGIA
A elaboração do trabalho se deu em três etapas. A primeira consistiu na abordagem teórica da temática. Para isso verificamos alguns autores que tratam dos conceitos de sexualidade, de juventude, de gênero e das relações amorosas. Na segunda etapa realizamos o trabalho de campo, no qual, entrevistamos e acompanhamos um grupo de meninas que assumem abertamente preferir esse tipo de relacionamento. A terceira etapa se deu na elaboração desse relatório que apresenta algumas considerações que podemos observar durante o tempo de execução do projeto.
Para isso, optamos por trabalhar com dois grupos distintos de jovens universitárias entre 20 e 25 anos, que aderem à prática do ficar. A pesquisa é de natureza qualitativa, com roteiro de entrevistas semi-estruturado. Acompanhamos o grupo de entrevistadas em dois eventos e suscitamos debates grupais sobre temas relevantes para pesquisa.

CONCLUSÃO
Ao longo do processo pudemos observar que a metodologia utilizada foi de grande importância para a nossa análise, visto que através dela podemos observar as contradições e aproximações existentes entre a fala e a prática das entrevistadas.
Podemos afirmar que parte das informações colhidas foram confirmadas durante o trabalho de campo. Grande parte do discurso apresentado pelas entrevistadas pôde ser confirmada em suas práticas cotidianas. As entrevistadas denotam o “ficar” como um tipo de relacionamento fortuito, passageiro e ao saírem com os amigos para a diversão (baladas, festas e barzinhos), apontam que sua prioridade não é o “ficar”. Podemos perceber tal questão na observação de campo durante o baile funk
[1]. No contato com os parceiros houve o momento de trocas de beijos e carícias, porém não vislumbraram futuros contatos, e quiseram dar fim a “ficada o mais rápido possível. Outro ponto observado no campo é o da escolha de parceiros. Em geral, elas afirmam que o critério para eleger os “ficantes” na noitada é a beleza e “estilo”, além disso, muitas falam da necessidade de se ter “bom papo”. Durante o evento do churrasco podemos perceber que esses padrões exigidos pelas meninas se encontram em uma lógica de identificação com o ambiente social em que elas freqüentam, portanto elas tendem a escolher meninos brancos, universitários e com estilo de falar e se vestir próximo ao delas.
Embora as jovens demonstrem serem progressistas e não possuírem preconceito – fato pelo qual nos chamou atenção para nossa aproximação – durante os eventos em que as acompanhamos, essas demonstram possuir um preconceito velado. Isso pôde ser observado na negação de qualquer relacionamento com pessoas com nível educacional abaixo do que elas exigem como tolerável.
Durante nossa pesquisa bibliográfica, tomamos como hipótese que a atual liberdade sexual adquirida pelas mulheres advém, em grande parte, das lutas e reivindicações do movimento feminista, em prol da liberdade destes sujeitos sociais. Em nossos grupos de discussões as entrevistadas concordam sobre a importância deste movimento e que estes trouxeram muitas conquistas para as mulheres, como inserção no mercado de trabalho e universidades. Porém, não conseguem enxergar a influência deste movimento na atual conjuntura em que se insere o sexo casual praticado pelas mulheres. Reafirmam sua postura quanto a este tipo de atitude, como prática individual, e algumas vezes reagem negativamente contra aquelas que praticam. Percebemos que as entrevistadas legitimam a assimetria entre os sexos no momento do “ficar”, uma vez que recriminam aquelas que praticam sexo casual e fazem brincadeiras, implicitamente preconceituosas, com aquelas que saem com mais de um homem por noite, porém quando estas atitudes são praticadas por homens são vistas como naturais.
Concluímos que o ficar não tem sido encarado como prioridade em uma noitada, porém uma saída perfeita deve ter beijo na boca. As entrevistadas priorizam se divertir com as amigas em contraponto a ficar com meninos. Embora não supervalorizem o ato do casamento, as entrevistadas têm as perspectiva de se casarem como forma de experimentar tal experiência, porém não descartam a possibilidade de divórcio, legitimando as múltiplas formas de família, como as monoparentais.
O trabalho foi de grande relevância para nossa formação profissional, visto que podemos ter contato com diversos aspectos que envolvem juventude, cultura e sociabilidade. Porém, cabe destacar que temática envolve muitas dimensões que extrapolam juventude e sexualidade que não puderam ser esgotadas neste trabalho devido a curto período para sua realização.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CALAZANS, G. Os jovens falam sobre sua sexualidade e saúde reprodutiva: elementos para reflexão.In: Retratos da Juventude Brasileira. Análise de uma pesquisa nacional. Abramo HW, & Branco PM,org. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo/Instituto Cidadania, 2005.

HEILBORN, Maria Luiza. “Construção de si, gênero e sexualidade”. In: HEILBORN, Maria Luiza (Org.). Sexualidades: o olhar das ciências sociais. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, [40-58], 1999.


JUSTO, J. S. . O "ficar" na adolescência e paradigmas de relacionamento amoroso na contemporaneidade. In: FIGUEIRÓ, M.N.D.; RIBEIRO, P.R.M.. (Org.). Adolescência em questão: estudos sobre sexualidade. Araraquara: Cultura Acadêmica, 2006, v. , p. 75-102.

LOURO, G.L. Nas redes do conceito de gênero. In: LOPES, M. J. M; MEYER, D.E.; WALDOW, V.R. (Orgs.). Gênero e Saúde. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.

TORRES, M. R. . Sexo, Prazer e Dor: Vivências Sexuais na Fala de Adolescentes Pobres de Salvador. In: Regina Maria Barbosa. (Org.). Interfaces: Gênero, Sexualidade e Saúde Reprodutiva. Campinas: Unicamp, 2002, p. -.


[1] O relatório deste trabalho de campo encontra-se neste blog postado no dia 04/07/09
PERFIL DAS ENTREVISTADAS
No decorrer do trabalho foram entrevistadas seis jovens universitárias, com idade variando de 20 a 23 anos. Dessas jovens, duas moram na zona norte do Rio de Janeiro, duas na zona sul e duas na região metropolitana (municípios de Duque de Caxias e São Gonçalo).
Em relação à escolaridade, como dito anteriormente, todas estão cursando o ensino superior, sendo que uma delas já concluiu um curso de ensino superior e está cursando uma segunda faculdade. Os cursos estudados pelas entrevistadas são divididos entre Serviço Social (03), Geografia (01), Letras (01) e Administração (01).
No momento da entrevista, (05) entrevistadas possuíam atividade remunerada, sendo que apenas uma não exerce tal atividade, mantendo-se com a pensão alimentícia fornecida pelo pai. Daquelas que recebem remuneração, todas declaram que ainda dependem financeiramente dos pais. Essas não contribuem para a renda familiar e contam com a complementação da renda pelos pais, para custear os gastos com a faculdade. Segundo as entrevistadas, a quantia que recebem é gasta com lazer e compras em geral. Com exceção de uma das entrevistadas que reside com uma amiga da família, as demais jovens residem com os pais, em imóvel próprio.
Em relação a cor/etnia, três se declaram brancas, duas morenas e uma parda. As jovens também afirmam não possuir namorado e no momento estarem “solteiras”.



ANÁLISE DAS ENTREVISTAS
O questionário conta com doze questões iniciais que abordam temas como a passagem da adolescência para fase adulta, relação entre lazer e ficar na juventude atual e a relação de gênero existente nas relações afetivas nos dias de hoje.
A maioria das entrevistadas (05) se auto-declaram adultas. Quatro destas relacionam a condição adulta à questão da idade – acima de 18 anos - e as responsabilidades de seus atos perante a lei; uma delas declara que é adulta pois as pessoas dizem isso a ela; e apenas uma teve dificuldade em se localizar em alguma posição, afirmando “não sou madura para ser adulta, não pago contas nem tenho responsabilidades, mas também não sou adolescente”. Durante a aplicação dos questionários pudemos perceber as dificuldades que as entrevistadas possuem em se classificar adultas ou não, porém todas não gostam de ser identificadas como adolescente. Muitas baseiam sua fala em instrumentos legais que as declaram como adultas, porém se contradizem ao longo do questionário.
Quando questionadas sobre como se enxergam daqui a 20 anos, cinco das entrevistadas fazem referência a casamento, inclusive uma afirma que já estará divorciada. Embora a sociedade atual esteja diante da desconstrução da instituição casamento, grande parte declara que pretende viver esta experiência, mesmo que não seja para sempre. As entrevistadas não tem o casamento como prioridade, e objetivo central, mas fazem clara referência em constituir em ter filhos. Segundo nossa avaliação, as entrevistadas não valorizam a família patriarcal uma vez que colocam os filhos como prioridade frente ao casamento, como apontado por Justos em seu estudo:
“Há algum tempo vem-se observando mudanças na organização da família devido às transformações nos vínculos amorosos e nos relacionamentos que davam suporte a família nuclear tradicional.” (JUSTO, 2005)
Através das entrevistas e discussões realizadas em grupo com as entrevistadas é notório a descrédito no amor romântico e único. Todas as entrevistadas apontam a inexistência de um único amor na vida ou um “príncipe encantado”. Afirmam que atualmente os jovens vêm banalizando o verbo amar e que amar é algo difícil de ser definido, mas que envolve companheirismo, lealdade e respeito. Metade das entrevistadas relata que nunca viveram um “amor de verdade”, e desvinculam totalmente o significado de amor e paixão.
Todas as entrevistadas definem o ficar como algo passageiro e momentâneo:
Possibilidade instantânea de matar um desejo sem haver compromisso” (J.B., 23 anos)
“É algo sem compromisso, instantâneo, só para saciar a vontade” (P.R.G., 23 anos)
“Estabelecer contato sem qualquer expectativa” (K.S.M., 20 anos)
Através da fala das pesquisadas podemos perceber que estas desvinculam o conceito de ficar e namorar, porém concordam o primeiro seja necessário para existência do segundo. Alegam que para haver um relacionamento mais sério é necessário estabelecer um primeiro contato, para depois então firmar um namoro. Tal perspectiva reafirma a análise de Justos sobre o ficar:
“Embora a palavra ‘ficar’ tenha o sentido genérico de parada e permanência, sugerindo uma certa fixação em algum lugar, seu uso pelos adolescentes ao contrário, designa um relacionamento episódico e ocasional, a maioria das vezes com a duração de apenas algumas horas ao longo de uma noitada de festa e diversão. A prática mais comum envolve beijos, abraços e carinhos. Outra característica importante é que o ‘ficar’ não implica compromissos futuros e é visto como um relacionamento passageiro, fortuito, superficial sem maiores conseqüências ou envolvimentos profundos”(JUSTOS, 2005)
Analisamos que o ficar vem sendo socialmente “aceito” pela sociedade, estando popularizado nas práticas sociais dos sujeitos. Uma das hipóteses que consideramos para este fenômeno é que em nossa sociedade há uma naturalização da sexualidade entre os jovens e adolescentes (CALAZANS, 2005)
Outro ponto abordado na entrevista é a diferença de significado do ficar para os homens e para as mulheres. A maioria das entrevistadas afirmam que existe esta diferença: os homens pensam o ficar como uma iniciativa do ato sexual, enquanto as mulheres não; ou que esta diferença ocorre devido ao fato das mulheres “ficarem” para buscar um relacionamento sério enquanto os homens enxergam o ficar com um fim em si mesmo.
Quando questionadas sobre o sexo casual como conquista do movimento feminista, todas as entrevistadas negaram tal perspectiva. Afirmam que a mulher pratica sexo por uma opção individual, não sofrendo qualquer influência da luta feminista. Percebemos que as entrevistadas não avaliaram a luta pela liberdade sexual do movimento feminista no final do século XX como motivador da maior liberdade de opção que as mulheres possuem atualmente.

sábado, 4 de julho de 2009

Relatório de trabalho de campo no aniversário



Devido aos sucessivos "rolés" realizados por algumas participantes da entrevista, optamos por realizar um novo trabalho de campo. Desta vez quem iria escolher o local seria o grupo que foi convidado para o baile do Salgueiro, e que neste evento deveria convidar o outro grupo de amigas para um novo evento.
Marcamos o dia e horário, porém por indisponibilidade de tempo duas das entrevistadas não puderam comparecer. Com dia e horário definido, faltou o local escolhido. De última hora, literalmente 1 hora antes do horário marcado, uma das meninas sugeriu que nós fôssemos para um churrasco de um amigo da prima dela. No dia 20 de junho de 2009, às 17 horas, fomos em direção a um bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro, sem saber muito bem o que nos esperava, visto que nenhuma das participantes da pesquisa conhecia o aniversariante.
Ao chegarmos à estação do metrô do bairro, a nossa anfitriã (a prima de uma das entrevistadas) nos esperava em companhia de um rapaz. Disse-nos que tinha uma revelação a fazer que nos assustaria, o que deixou todas apreensivas. Ao longo da nossa caminhada até o local da festa, a anfitriã nos revelou que o aniversariante cometia atos ilícitos e que a festa era nas proximidades de uma favela, porém não no interior desta. Naquele momento todas as presentes ficaram receosas quanto a tal festa e ao que nos aguardava, porém fomos tranquilizada pela anfitriã e seu amigo.
Ao chegarmos ao aniversário, defrontamo-nos com uma espaço para eventos com uma churrasqueira na entrada da favela com as luzes apagadas, sendo a única fonte de iluminação o jogo de luz do DJ. Havia o uso explícito de algumas drogas ilícitas e álcool em excesso. Pudemos perceber que mesmo que discretamente havia pessoas armadas no local. Fomos recepcionadas pelo aniversariante que nos tratou com toda educação cabível, oferecendo-nos cerveja e outros tipos de droga e avisou que não precisaríamos pagar pelo evento.
No local havia abundância de bebida alcoólica e drogas, além de contar com a presença de um grupo de pagode conhecido na mídia e DJ tocando funk, que exaltavam o uso de armas e o tráfico de drogas. No início algumas das entrevistadas ficaram apreensivas e queriam ir embora, porém com o passar do
tempo pudemos perceber que elas acostumaram-se com o local e até caracterizaram o ambiente como "tranquilo e ameno". Segundo nossa avaliação algumas das entrevistadas demonstraram interesse em permanecer no local devido à sensação e perigo que aquela situação oferecia, visto que nunca haviam vivenciado algo do tipo.
Embora o clima de apreensão, as entrevistadas mantiveram a mesma postura do último evento, continuando com o clima de entrosamento e brincadeira entre si e com os presentes. Por não estarem acostumadas com este tipo de ambiente, muitas fizeram observações e brincadeiras sobre o modo de vestir e dançar dos demais frequentadores do evento. Embora estivessem no evento, a todo momento elas queriam pontuar que eram diferentes daqueles frequentadores, exprimindo um ar de superioridade sobre aqueles.
Nenhuma demonstrou interesse por qualquer menino, nem sequer exprimiu comentários sobre a beleza de alguém, segundo elas o "terreno não era fértil". Em contrapartida, os rapazes cobiçavam-nas e tentaram por diversas vezes algum tipo de aproximação. Muitas conversaram, riram e até brincaram com os rapazes, mas fizeram questão de deixar bem claro que aquilo não passaria do limite da amizade.
Quando os rapazes saíam de perto, as entrevistadas faziam diversos comentários sobre roupa, erros de português na fala e a impossibilidade de qualquer envolvimento amoroso com eles, mesmo que seja apenas um ficar.
Podemos perceber, que no referido evento as entrevistadas se sentiram pouco a vontade, pois temiam a "reação dos praticantes de atos ilícitos". Ao longo da festa, fizeram questão de se colocar em um nível de superioridade dos demais participantes do evento, posição que estes legitimaram. Portanto, acreditamos que embora este evento tenha muitas características parecidas com o Baile do Salgueiro, as entrevistadas fizeram questão de se colocar como parte externa a esse mundo sem qualquer tipo de relação com este.

Relatório do trabalho de campo na Quadra do Salgueiro


Propomos ao nosso grupo de entrevistada que necessitaríamos de sair um dia para "balada" junto a elas para observarmos como se dariam suas atitudes neste espaço. Estas nos proporam a ir a um aniversário de uma amiga que seria realizado no dia 29 de maio de 2009, na Quadra do Salgueiro durante o baile funk realizado pela Furacão 2000. Como dito anteriormente, o grupo de entrevistadas compõe se por dois grupos distintos de amigas. A proposta da ida ao Baile do Salgueiro partiu de um grupo e levamos esta ao outro grupo de amigas, que de imediato gostaram da proposta e confirmaram presença no evento.
Marcamos de nos reunir na casa de uma das pesquisadoras, próximo ao local do evento, onde todas as entrevistadas se arrumariam para a "balada”. Durante os preparativos, percebemos que todas as meninas estavam bastante preocupadas com sua aparência e algumas ansiosas para saber como seria este local, visto que nunca tinham ido antes ao evento.
Partimos por volta das 21 horas para a quadra do Salgueiro. As entrevistadas optaram por irem cedo para beberem na porta, visto que "a bebida lá dentro é muito cara". Todas nós pegamos um ônibus do Méier até o Andaraí e durante o trajeto podemos perceber a facilidade de entrosamento entre as entrevistas- algumas nunca haviam se visto anteriormente. Ao chegarmos à porta do baile, de pronto uma das meninas conseguiu cadeiras e mesa com um ambulante, que já a conhecia de outros bailes. Ali iniciaram o consumo de cerveja que perduraria ao longo da noite. Aproveitaram aquele momento para "fazer o reconhecimento da área' e explorar possíveis ficantes. Daquelas que não conheciam o local, observamos surpresa, visto que imaginavam que a quadra do Salgueiro seria na entrada da favela e por isso só teria presente no local o "pessoal da área". Notaram e fizeram diversos comentários sobre a quantidade de "playbozada
[1]" presente no local, encontrando diversos colegas da faculdade. Estes colegas nos disseram que eram frequentadores assíduos do local e que não se importavam de sair da Zona Sul para curtir o baile ali, trocando "qualquer Baronetti[2] pelo baile do Sal[3]".
Depois de cerca de 2 horas na porta do evento "fazendo uma social
[4]", as meninas resolveram adentrar no recinto. Cada uma desembolsou R$ 10 para a entrada e beberam cerveja (R$ 3 cada lata) e caipirinha (R$5 o copo de 300 ml). Cada entrevistada gastou cerca de R$ 40 na noite, incluindo entrada, bebida e transporte.
Ao entrarmos na quadra do Salgueiro, logo chama-nos atenção a quantidade de vermelho (cor da escola de samba) existente no espaço, segundo uma das entrevistadas aquela "cor era para aumentar a libído". Ao longo da noite, o único ritmo tocado era o funk que em sua maioria trazia letras que suscitava a sexualidade. Notamos que ao entrarem no recinto, já com um nível alcoólico alterado, as entrevistadas não diminuíram o ritmo de ingestão da bebida. Permaneceu o clima de descontração e entrosamento entre as entrevistadas. Entre algumas risadas e danças engraçadas, havia algum comentário de algum garoto bonito que as chamava atenção, e prontamente todas olhavam para o rapaz de uma só vez sem qualquer preocupação em disfarçar. Porém, percebemos que o grupo de entrevistada não mantinham o foco na paquera, mas sim queriam rir e "sacanear" entre si e as outras pessoas. Tal postura era diferente dos demais frequentadores do local que em sua maioria estavam à procura de um (a) ficante. Algumas meninas começaram a se destacar e começaram a "dar rolés
[5]" sozinhas, a fim de procurarem algum menino que as interessasse, mas a grande maioria permaneceu junta e com as recorrentes brincadeiras sobre o estilo das demais pessoas ou o "nível de beleza".
Embora as meninas não tenham realizado o "jogo de sedução
[6]" muito utilizado nas boates do Rio de Janeiro e tenham priorizado a diversão entre si, dentre as seis entrevistadas presentes apenas uma não ficou com ninguém, sendo que duas ficaram com mais de um menino. Um fato interessante que nos chamou atenção é que grande parte das meninas não queria ficar muito tempo com o menino-ficante, queriam apenas beijar e que ele fosse embora para que elas pudessem rir e dançar mais entre as amigas. Tal fato reflete bem os dados colhidos nas entrevistas quando a grande maioria coloca o ficar apenas como um ato imediato sem qualquer ligação com um futuro relacionamento, ocasionado para saciar uma vontade momentânea.
Dentre todas as ficadas, apenas duas trocaram telefone, sendo que apenas uma recebeu ligação no dia seguinte e encontrou-se com o ficante algumas vezes durante o período da pesquisa.
Podemos concluir que ao longo deste trabalho de campo muitas das afirmativas fornecidas no questionário puderam ser confirmadas, como a imediaticidade do ficar e a questão de gênero presente no ficar, uma vez que as meninas que ficaram com mais de um menino foram alvo de brincadeiras entre elas, como se esta fosse uma atitude rara de ocorrer nos dias atuais, sendo normal entre os homens e vexatório entre as mulheres. É notório que a comemoração do aniversário da amiga foi tomada como um momento de confraternização, onde todas queriam sair, dançar e brincar, sendo sua ultima prioridade ficar com alguém. Por fim, destacamos que grande parte das entrevistadas fez uso abusivo de álcool o que as deixou mais a vontade para realizar brincadeiras que em outros momentos seriam tidas como "sem-noção".
[1] Neste contexto, jovens de classe média e classe média alta que se vestem bem e que nada se assemelham aos moradores da favela.
[2]Boate de luxo na Zona Sul do Rio de Janeiro
[3]Como é popularmente conhecido o baile funk do Salgueiro
[4] Conversar entre amigos, encontrar pessoas, marcar presença em algum local.
[5]Sair do local fixo onde os amigos estão para encontrar ou paquerar outras pessoas.
[6]As entrevistadas diversas vezes afirmam que não fazem jogo de sedução, ou seja, não estão preocupadas em conquistar os homens, agem naturalmente.

sábado, 13 de junho de 2009

Resenha “O ficar na adolescência e paradigmas de relacionamento amorosos na contemporeneidade” – José Sterza Justo

A adolescência é conhecida como uma fase da vida onde os sujeitos estão mais suscetíveis às influências sociais, visto que esta é uma fase de transição entre o mundo privado para o mundo público, quando o indivíduo abandona o “casulo protetivo” da família e conhece o universo muito mais amplo e complexo da sociedade. Diferentemente dos adultos, o adolescente não possui defesas egóicas capaz de aliviar o impacto das mudanças socioeconômicas e culturais vividas devido à diferença entre estes dois mundos (privado e público). Este primeiro contato cria o que chamamos de crise da adolescência, que ao se referir a esta fase da vida recebe um valor semântico valorativo, visto que representa ganhos ou melhorias para o sujeito. A partir desta concepção, a adolescência é vista como expressão máxima de juventude, beleza, liberdade, espírito crítico, disposição para mudança e de outros tantos atributos que a fazem uma fase bastante prestigiada e cobiçada.
A partir do século XX podemos perceber uma valorização da adolescência no mundo ocidental. Na cultura brasileira recebeu ainda mais reforço por esta ser afeita à novidades, inovações, mudanças e outros atributos infundidos a este período da vida. A formação da cultura brasileira é influenciada pelos imigrantes e sua ruptura com suas referências anteriores, culminando em uma extrema valorização do novo em detrimento do passado. Este processo de migração é marcado pela forte dominação dos nativos pelos imigrantes, o que não impediu que a miscigenação tenha sido difundida amplamente entre estes. Tal fato marcou profundamente a cultura brasileira que passa a ser referenciada pela sua abertura para o novo, o diferente, o estrangeiro, o que ocorre mesmo nos setores mais conservadores desta sociedade. Com todas as dificuldade e contradições aparentes, a cultura brasileira aprendeu a conviver e articular o espírito conservador com o progressista, o culto às tradições e a valorização do novo.
A cultura brasileira possui valores essenciais da contemporaneidade: a idéia de miscigenação, convivência com as diferenças e com as impurezas (pós-moderno) contidas na mentalidade brasileira, nada mais é que a contraposição ao ideário de pureza da modernidade. Este cultura é extremamente aberta às influências externas, ao nomadismo e ao desapego à identidade nacional. É um povo que possui o desprendimento como norma, venera o estrangeiro, o diferente. Tal valorização do novo e axaltação às ruptura tem fim por valorizar, entre outras coisas, o jovem e a adolescência.
Entre nós, observamos a supervalorização do jovem e a depreciação exagerada dos idosos. A cidade é dos jovens, daqueles que circulam e são alvo de consumo e da publicidade. A cultura da flexibilidade, da mobilidade e da efemeridade elege o adolescente como modelo. O adolescente é reconhecido como um sujeito desterritorializado, plástico, flexível, consumista e narcisistas. Embora tais características não sejam exclusivas dos adolescentes, é sobre eles que ela se faz mais impiedosa.
Neste contexto, prevalece a lógica do imediatismo, onde os sujeitos devem satisfazer suas necessidades e desejos em tempo real. É sobre o adolescente que se realiza, mais extensivamente, a ruptura das fronteiras do tempo tornando-o um sujeito instantâneo, preparado para responder imediatamente as demandas que lhe são colocadas.
O sujeito construído na atualidade não tende para uma estruturação unitária e contínua. Este se constrói em redes e não mais em torno de um centro ou eixo, tal como apresentado nas teorias psicológicas tradicionais.
Com o passar dos anos, observamos mudanças profundas na organização da família devido a transformações nos vínculos amorosos e nos relacionamentos que davam suporte à família tradicional. A dispersão, a instabilidade, a desterritorialização e o desenraizamento tem sido produtores de relacionamentos mais abreviados e instantâneos, incompatíveis com o modelo de família nuclear que marcou durante anos a cultura brasileira.. Com a globalização - aceleração do tempo e a derrubada de fronteiras geográficas e psicossociais - as relações passam a ser mais fluídas e instantâneas, inviabilizando a aliança conjugal eterna. O amor romântico perde espaço para um amor confluente e um relacionamento puro, marcado pela horizontalização e igualdade entre homens e mulheres e a co-satisfação entre os parceiros. A sexualidade visava orientar a busca por outros objetivos além do próprio prazer, atualmente o sexo está desconectado destes outros objetivos, cumprindo apenas a finalidade de satisfação do prazer.
Trata-se de um mundo que não favorece a aproximação entre as pessoas e a criação de vínculos duradouros. Por sua vez, os adolescentes se vêem impelidos a instituir relações instantâneas, voltadas para satisfação de necessidades e desejos imediatos. Entre os vários relacionamentos afetivos típicos da contemporaneidade, destaca-se o “ficar” que, sem dúvida, é o mais expressivo da cultura atual.
A palavra “ficar”, embora nos remeta a sensação de parada e permanência, tem sido utilizada pelos adolescentes para designar um relacionamento episódico e ocasional, na maioria das vezes, com duração de horas que envolvem beijos, abraços e carinhos. Outra característica deste modelo de relacionamento afetivo é que este não implica qualquer compromisso ou envolvimento futuro. “No ficar predomina a sensorialidade, a brevidade do contato, a ausência de exclusividade e de compromisso, a descartabilidade do outro e a não obrigatoriedade da presença de sentimento” (JUSTO, 2005, pág. 71).
Embora o “ficar” seja mais reconhecido e lembrado, os adolescentes apontam o namoro como o relacionamento preferido entre eles– segundo algumas pesquisas realizadas com jovens. Para alguns autores, o “ficar” tem sido utilizado como um primeiro contato, como uma forma de experimentar sentimentos e parceiros; que tem como objetivo explorar parceiros para então constituir relacionamentos mais duradouros, principalmente entre as meninas. Porém, não podemos generalizar tal perspectiva, visto que muitos adolescentes ainda enxergam o “ficar” como um fim em si mesmo, sem perspectiva de compromisso futuro.
Ainda, percebe-se que o “ficar” traz consigo uma questão de gênero, onde fica clara a dominação e submissão histórica da mulher. Embora o ficar venha sendo socialmente aceito pela sociedade, a menina que “fica” com muitos meninos possui maior dificuldade em encontrar namorados firmes, sendo considerada apenas como uma boa parceira para noitadas. Tal fato não caracteriza a desonra da mulher como outrora, porém deixa clara a existência de desigualdade na forma de perceber homens e mulheres. É também sobre as mulheres que mais recaem os dilemas e angústias geradas pelos relacionamentos amorosos e pela sexualidade. Por um lado, o “ficar” apresenta a busca por liberdade e prazer, por outro, aponta dilemas, freios e contradições insuperáveis. A instabilidade traz uma sensação de insegurança e desamparo, ao contraponto que o namoro e casamento trazem uma vida muito limitada e pesada pelos compromissos domésticos.
Portanto, o “ficar” não pode ser considerado um modismo ou um fenômeno superficial e isolado, mas sim um fenômeno típico do tempo e espaço da atualidade. A abreviação do tempo e o caráter efêmero e provisório do “ficar” estão presentes em vários cenários da contemporaneidade, como abreviação dos vínculos empregatícios e rarefação dos relacionamentos sólidos. Logo, os adolescentes permanecem na tensão gerada por modelos de amor e relacionamentos antigos e modelos construídos socialmente na atualidade.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

O ficar dos adolescentes
Ana Luiza Ferraz


O que é adolescência e como os jovens encaram e se comportam com o sexo oposto e também como lidam com os relacionamentos afetivos.
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Todos nós passamos pela chamada fase da adolescência que é o período entre a infância e a fase adulta. Segundo a Organização Mundial da Saúde esse período é estabelecido entre os 10 e 20 anos de idade, já o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece outra faixa etária: dos 12 aos 18 anos. É um período no qual o indivíduo passa por muitas mudanças físicas, psicológicas e tem como características as chamadas “revoltas”, manias e várias outras atitudes. É nesse momento que os jovens começam a conhecer a relação entre um homem e uma mulher. Existem vários tipos de relacionamentos afetivos, mas o “ficar” é o mais presente na vida desses jovens. Designa num relacionamento episódico e ocasional, na maioria das vezes com duração de algumas horas durante uma festa ou num momento de diversão. A prática mais comum envolve beijos, abraços e carinhos, tendo com característica importante a não implicação de compromissos futuros e é visto como algo passageiro, sem conseqüências ou envolvimentos. Esse tipo de relacionamento tem características que coincidem com o comportamento desses jovens. Por ser algo que não implica em compromissos sérios significa que o adolescente não está pronto para assumir responsabilidades e eles encaram o “ficar” com muita naturalidade exatamente por esse motivo. Lembrando sempre que nos referimos aos adolescentes de uma forma em geral. Porém, existe uma diferença entre meninos e meninas quanto à preferência ou não de “ficar”. Geralmente os meninos são mais adeptos a esse hábito enquanto que as meninas preferem namorar a “ficar”. Talvez isso demonstre que as meninas amadurecem mais cedo que os meninos. Seja qual for à preferência entre os sexos, o “ficar” é um modo de explorar e experimentar sentimentos, parceiros e situações de escolhas para tomada de decisões que exigem mais responsabilidade, pois muitos desses adolescentes relatam que o “ficar” é um primeiro contato que poderia levar a um namoro. Por mais conservador que possa parecer nos dias de hoje, existe certa recriminação em relação àqueles que “ficam” com freqüência, principalmente para as meninas, pois elas são vistas como “galinhas”, “não-sérias” e “não confiáveis”, passíveis de rejeição tanto por parte dos meninos como das meninas. O “ficar” é como um estágio para futuros relacionamentos afetivos, mas é preciso ter cautela e saber se preservar.
Referências Bibliográficas:BECKER, Daniel – “O que é adolescência”, Ed. BrasilienseZAGURY,Tânia – “O adolescente por ele mesmo”, Ed. RecordHARRISON, Michelle – “O primeiro livro do adolescente sobre amor, sexo e AIDS”, Ed. Artmed, 1996

segunda-feira, 8 de junho de 2009